Ontem, tarde da noite, fui impactada com a notícia da morte do ator Chadwick Boseman, o rei T’Challa do aclamado filme Pantera Negra. Confesso que recorri a vários jornais na esperança de ser uma maldosa fake news, uma mentira, porém, infelizmente não era. Vivi o mesmo sentimento de quando o cantor Vander Lee morreu, desolação. Não sei porque, mas alguns artistas se tornam meio que membros de nossas famílias e quando se vão assim, silenciosamente, a dor é implacável. Acompanho o ator há algum tempo e ele está magistral, por exemplo, interpretando James Brown. Mas o Pantera Negra é, sem dúvida, uma marca ao reunir um elenco negro e nos representar em tela grande. Denzel Washington disse em entrevista, certa vez, que chorou ao assistir ao filme, pois agradeceu por estar passando o bastão. A vida é bruta, a morte também o é. Para um doente, ir pode torna-se um alívio de toda dor que sente, mas para quem fica resta chorar não por quem foi, mas porque terá que seguir sem o amigo, a amiga, o companheiro, a companheira. A vida é bruta, mas a morte também o é. Quando Michael Jackson morreu e eu cheguei no trabalho desolada por causa disso, um colega gastou um tempo debochando de mim, sim, debochando porque achava ridículo o que eu sentia. Em um difícil exercício, entendi que ele uma criança branca, depois um adolescente branco e mais depois ainda um adulto branco que sempre se viu e se vê representado nos livros, nos programas de tevê, um conjunto de crianças negras cantando em nada deve ter alterado a vida dele. Para mim, minhas irmãs, amigos e amigas negras, foi impactante ver mais que um grupo, mais que um conjunto, mas uma família negra cantando, dançando, com seus cabelos black power, com seus cabelos naturais, nos levando a pensar: é possível? Sim, é possível, e entendo a felicidade de Denzel Washington ao assistir ao filme. Portanto, um ator assumidamente negro nos representando nas telas é bem mais que um simples ato de representar, de atuar. Vidas negras importam em todos os sentidos e em todos os níveis. Meu respeito forever por Chadwick, pois em tempos, de chá de revelação de doenças, onde artistas midiáticos fazem questão de anunciar que estão com doenças graves e aí, parece que surge uma competição para ver quem tem a doença em estágio mais avançado, nosso Pantera Negra, escolheu fazer filmes, excelentes filmes, representar de forma magnífica maravilhosos personagens. Uma vez o ator Leonard Nimoy, o Spock da primeira geração de Jornada nas Estrelas disse que, jovem, assistiu a um outro ator jovem, negro - Harry Belafonte- em um monólogo. Nessa peça em alguns atos esse ator muito dizia apenas gestualmente, não verbalizava uma só palavra. Ele, ao fim do espetáculo, saiu modificado do teatro e então entendeu que “não é preciso fazer barulho para causar impacto”. A saída de Boseman é a materialização disso. Não sei como ficará Wakanda agora, eu, que desejei morar lá, vou conviver com a ausência do rei que era a cara daquele lugar. Se o ator será substituído, não sei, ainda que seja, a marca ficou e artisticamente, me desculpem, muitos tentam, mas brilho, brilho mesmo, de verdade, é pra poucos, é pra raros. Wakandamente infeliz.
Jussara Santos
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